Não quero crescer – Sindrome de Peter Pan
- Mais uma entrevista concedida à mídia em que esclareço as razões que levam a pessoa a não querer crescer. A famosa Síndrome de Peter Pan. Vale a pena conferir.
- · O que é a síndrome de Peter Pan? Ela é uma característica, um transtorno ou uma doença?
A Sindrome de Peter Pan foi um termo aceito em psicologia desde a publicação de um livro escrito em 1983 The Peter Pan Syndrome: Men Who Have Never Grown Up ou “síndrome do homem que nunca cresce”, escrito pelo Dr. Dan Kiley. No entanto não é considerada pelos manuais de transtornos mentais como uma síndrome, ou seja, uma doença que possui um conjunto específico de características físicas e psicológicas. Porém, o que este conceito aborda? Aqueles homens cronologicamente com idade suficiente para terem responsabilidades, trabalho, compromissos, e principalmente casarem-se, e constituir família, mas quanto a sua idade emocional e psiquica eles permanecem meninos. Isto é: vivem no viveogame, brincando de flertar, sem responsabilidades ou compromissos.
- · É uma síndrome comum?
Sim, hoje em dia, mais comum do que antigamente. Em minha experiência clinica muitas mulheres entre 30 e 40 anos queixam-se de que os homens desta mesma faixa etária não querem compromisso sério, agem como adolescentes só querem ficar e transar sem construir um relacionamento maduro compromissado e com projetos para o futuro.
Penso que isto está acontecendo mais hoje em dia por várias circunstancias do mundo atual: 1º – o custo de vida é alto e as pessoas prolongam ao máximo o tempo em viver na casa e na dependência financeira dos pais. 2º lugar- o mundo da fantasia está tão avançado e evoluído que abarca os adultos: Como por exemplo, videogame, Playstation, as pessoas querem desfrutar, viajar, se divertir, frequentar baladas, etc. 3º lugar – Há uma confusão, as pessoas se enganam pensando que é isto ou aquilo, ou seja: ou me divirto ou serei um homem sério. Mas há um ledo engano neste pensamento porque é possível construir, ou seja, estudar e se desenvolver como profissional, edificar um relacionamento profundo, longo, duradouro e compromissado, e ao mesmo tempo se divertir – Diria que isto acontece porque muitas pessoas não compreendem que uma vida boa equilibrada ocorre quando podemos transitar nas diferentes possibilidades que a vida nos oferta: brincar, construir, divertir-se, responsabilizar-se, amar sem sentir-se enclausurado nesta relação mas de forma madura, livre e saudável. Em resumo, as pessoas pensam que só há uma maneira de viver, muitos não abrangem que não é isto ou aquilo, mas a vida pode ser isto e aquilo, só é preciso ter bom senso e dosar.
- · Ela acontece somente entre homens ou também é comum entre mulheres?
Mais entre homens. As mulheres, em geral amadurecem mais cedo e optam por uma vida mais madura e estável. Mas, isto não é regra. Vejo mulheres com mais de trinta anos que vivem em meio as drogas no mundo da fantasia e sem planos para a vida. Isto acontece, tanto em homens como em mulheres, porque quando temos algo em abundancia, seja lá o que for, aquilo vai perdendo a graça, então precisamos mais e mais daquilo para nos satisfazer, e por fim podemos ficar afogados naquilo e mortos para as outras possibilidades (este é o mecanismo dos vícios). No caso da Síndrome de Peter Pan as pessoas mergulham no mundo da fantasia, da não responsabilidade, da brincadeira, enfim do eterno menino.
- · Qual é a papel dos pais neste processo?
Saber transmitir valores para os filhos é uma arte. Porque se os pais forem severos, rígidos, invasivos em suas colocações podem afastar os filhos de si e estimular que eles se rebelem justamente contra aquilo que os pais tentam incutir.
Quando um pai vê que seu filho está se tornando um eterno adolescente, é o momento de conversar, dialogar, questionar com afeto, nunca acusando, rebaixando ou “jogando pedras”, porque quando a gente joga pedras o outro põe um escudo. Ouvir em primeiro lugar o que o filho tem a dizer sobre o estilo adolescente de vida que leva, e depois conversar. Entrar na questão do isto e aquilo, ou seja, é possível se divertir e construir e crescer e também ser criança, e se for assim, a diversão é bem melhor, porque tudo que existe, só existe no contraste, por exemplo: Só há claro porque há escuro, só há o bonito porque existe o feio, só existem férias porque trabalhamos, caso contrário, as coisas perdem o valor. Se a conversa for produtiva, ótimo, caso contrário, seria útil buscar ajuda profissional (psicólogo), mas o filho precisa desejar ser ajudado, se não quiser, não funcionará.
- · No que ela prejudica seu “portador”?
Na vida intelectual, profissional e afetiva, de um modo geral. Porque nós construímos quando levamos a sério e nos responsabilizamos.
- · Como é a forma correta de se livrar desta postura?
Saber que é possível brincar, se divertir e viver no mundo da fantasia e na mesma medida ser responsável, planejar e construir objetos de vida: trabalho, estudos, casamento e família. Que uma possibilidade não anula a outra no nosso jeito de ser. Que é muito bom que a criança que vive em nós nunca morra, mas também que o nosso lado criança não tome conta da nossa faceta adulta impedindo-nos de realizar.
É útil e produtivo ter consciência que a melhor maneira de viver a vida é transitando de forma equilibrada e saudável dando voz aos diferentes Eus que habitam em nós. Com bom senso podemos viver nosso lado criança, adulto, adolescente, construtivo, responsável, brincalhão, sério, maduro, inconsequente… Cada aspecto de nós encontrará seu momento para emergir. Assim a vida ficará bem mais interessante.
Meus créditos:
Léa Michaan – Psicanalista.
Pós-graduada em Psicoterapia Psicanalítica pela USP;
Mestre em Psicologia Clinica pela PUC – Atende crianças, adolescentes, adultos e casais.
Autora do livro Maly da Primavera Editorial – Romance envolvente e inspirador – Impossível não virar a página (segundo depoimentos de leitores).
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